setembro 25, 2015

Só uma história de amor

    É só o começo da sua vida em um dia que está quase acabando e você o vê. O cara na sua frente tem aparência que seu gosto estranho aprova e diz coisas que só te provocam riso porque vêm dele. Mais tarde você vai para casa com um pouco de álcool agindo por dentro, mas pensando na visão do lado de fora, naquele moço que te roubou por uma madrugada inteira. Você vai deitar a cabeça no travesseiro e cerveja nenhuma te fará dormir. A partir da noite sem fim, as horas nunca mais vão passar mais rápido, pois a vida acaba de desacelerar. É seu primeiro amor, grande amor, sua primeira MPB, seu primeiro filme francês, sua primeira comédia romântica de fim ainda indefinido. E, por destino ou peças que você prega, ele entra na sua rotina e se torna não só a pessoa que inunda suas semanas de ócio, mas seu plano de resolução da vida cansativa e tediosa que leva desde sempre. Você o encontra por acaso e se pega sorrindo sozinha no meio de uma distração. Fica dois ou três dias sem vê-lo e sente um aperto no peito, uma vontade de ligar, mandar mensagem, gritar o nome. Ele é o cara-dos-sonhos, das noites em branco, o apelo que se repete na sua mente quando você vai lavar louça, estudar para uma prova e conversar sobre amor com os amigos. Vinte e quatro horas é pouco tempo para dois e tempo demais para um. Em algumas noites o moço vem te resgatar na sua casa, te leva para lugares melhores, te apresenta histórias dele e constrói novas ao seu lado. Em algumas tardes vocês fogem para lugar nenhum, que ninguém pode encontrar, e são felizes por um curto espaço de tempo. Nas manhãs, o seu motivo de dizer bom dia é finalmente sincero. Ele é o único e o tanto de coisas sentidas nem cabem em um coração novinho que quase não sentia nada antes, só batia. Você faz uma decisão porque há dias já pensava em fazer algo. Você você vai ao topo de seu mundo, grita o nome dele e pede para que fique para sempre, ainda que "pra sempre" seja tempo indeterminado. Seus olhinhos brilham. Será o fim da vontade de encontrá-lo, pois a partir dessa hora ele estará perto em todos os momentos. Será a certeza de que ele é só seu, porque você é só dele desde a noite em que ainda não se conheciam. A resposta demora. A resposta parece nem querer chegar. Você pensa nas outras demoras, elas não doeram tanto. Pensa nas vezes em que os encontros foram desmarcados e foram mais fáceis de digerir que o sumiço de agora. Pensa demais até que ele aparece e diz: eu não posso ficar, não somos feitos para dar certo. Encerra-se o clímax. Você se encontra de um lado enxergando o outro: enquanto pensava só nele, ele pensava no trabalho, nas outras mulheres, nos estudos, no que fazer no jantar, por quantos dias a mais duraria o salário. Enquanto você imaginava uma vida mais bonita, ele lutava para se acertar no presente que nunca quis. As saídas, os encontros, os esbarrões faziam os dois felizes, mas a intensidade era para um só, para você.
    Então, nessa noite de um ano depois, no mesmo lugar, perdida quase do mesmo jeito, procurando ar para respirar e virando as cervejas fiéis, você o encontra. Ele ainda é a pessoa mais bonita do local, ainda tem a voz que mais chama sua atenção e ainda diz coisas que te fazem rir. Mas não é nele que você vai pensar quando voltar para casa e se deitar na cama. Você tem mais o que fazer, tem alguns problemas, umas coisas da vida que não adianta adiar por causa de amor.

Flávia Andrade

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